Sofia Ribeiro Fernandes, crónicas de uma Mãe Pediatra e de uma Pediatra Mãe



Sofia Ribeiro Fernandes, crónicas de uma Mãe Pediatra e de uma Pediatra Mãe


quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

A dança do R.

Existem príncipes e princesas deste lado mundo tão ou mais preguiçosos que o príncipe R., têm braços e pernas enferrujados, vagarosos, que rangem e teimam em não dançar a música que faz o mundo rodopiar. Rabugentos, os braços e pernas do pequeno príncipe R. de pele cor de ameixa, macia como o veludo e cheiro a pó de talco, aprenderam a gostar do arrepio mágico dos dedos delgados de umas senhoras que lhes tentavam ensinar a dançar. Era um arrepio assustador a que o seu corpo roliço se habituou e que foi evaporando com o tempo. Sempre que os príncipes e princesas rodopiavam numa correria à sua volta, o braço preguiçoso estendia-se, mão aberta como que à espera que essa dança veloz, tão simples para esses príncipes e princesas, também o levasse a ele...
Tento muitas vezes pensar como se fosse o príncipe R., sentado num chão de xadrez da salinha acolhedora da escola, e estender as mãos porque também queria dançar aquela música que fazia os meninos rodopiarem, elevarem os pés do chão e voarem como os anjos. Imagino como seria estar retido num corpito um tanto ou quanto enferrujado, como conseguia ter nos olhos um sorriso terno, recheado de vida... E, acho que não consigo fazê-lo...
E, as lições de todos os dias aconteciam, iam e vinham, os arrepios iam embora sem bilhete de volta, e os braços e pernas outrora sonolentos, aprendiam a dançar, a desenhar um voo baixinho, a fazer um vento morno nas bochechas rosadas como aquele que antes só sentia no rosto vindo do rodopiar dos outros meninos.
Um dia o pequeno R. vai rodopiar até ficar tão tonto como um pião, vai elevar os pés do chão até tocar com o dedo nas nuvens, vai sentir no rosto um vento fresco, sem cheiro, veloz de tanto correr...


A todas as mãos que outrora arrepiaram o R., que o fizeram e fazem aprender a dançar e a voar (ainda baixinho) num toque mágico de amor: Fisioterapeutas do UADIP-Porto e APPC-Porto e Terapeuta Irina.

2 comentários:

  1. O cérebro humano, a seguir à questão da existência de Deus, é um Universo de incógnitas. Apesar disso e pela minha experiência de vida é uma das coisas mais genuínas neste mundo por vezes injusto. Isto para dizer o seguinte: ... Por detrás de um rosto enigmático de uma criança pura que recebe todos os dias das mãos da sua mãe carinho, no vestir, no pentear, no dar de comer, no lavar, no jogar, umas mãos intemporais, sempre aveludadas como se o tempo não passasse por elas, por detrás desse rosto está o agradecimento de ser amado dessa maneira, da tua maneira, única, intransmissivel, certa.
    O R. é uma criança feliz, sinto isso nas tuas palavras, sinto isso naquele sorriso enorme que mostras ao mundo. Por isso acredita nas tuas mãos como as mãos que o R. usa e abusa e brinca e joga e bate palmas e aperta os atacadores e atira bolas de neve e escreve uma carta de amor à sua mãe...

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  2. É realmente um prazer ensinar este e outros príncipes e princesas a dançar!

    E por mais preguiçosos que sejam os braços e as pernas do R., ele adora dançar e fá-lo cada vez melhor...Chega mesmo a dizer que não pode interromper porque está a trabalhar ;)

    É um príncipe muito, muito especial o R.!

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