Sofia Ribeiro Fernandes, crónicas de uma Mãe Pediatra e de uma Pediatra Mãe



Sofia Ribeiro Fernandes, crónicas de uma Mãe Pediatra e de uma Pediatra Mãe


terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Just a point of view...

Ser Médico hoje e amanhã e por aí adiante... Mais uma vez, correndo sérios riscos de sanções e comentários azedos, encaixo uma mão cheia de dedos de Médicos diferentes. 
O Médico-dedo-mindinho, sou eu e outros tantos, que temos um contrato individual de trabalho com um valor muitas vezes extrapolado (dizem as más línguas de alguns Médicos). Assinamos um papel como se fosse a única réstea de ar que existe à face da Terra, com muitas coisas escritas que nos encostam à parede e que lemos rápido como se lá não estivessem escritas. Cumprimos horas de trabalho para além do previsto e somos os especialistas de segunda. Aceitamos desafios e somos chamados de inconscientes. Vivemos no hospital durante dois meses para absorver que nem esponjas aquilo que não tivemos oportunidade de fazer, porque ainda éramos pequenos internos. Não pertencemos a lado nenhum, mas quando é para descontar afinal somos função pública. Temos trabalhos fáceis, exequíveis por qualquer um, mas quando ficamos grávidos, descobrimos que afinal os "qualquer um" são poucos e raros. 
O Médico-dedo-médio, são os médicos acabados de sair da faculdade, internos do ano comum. Saltam de especialidade em especialidade, mas sem se quererem envolver com nada. Não têm autonomia para actos médicos ou para dar altas. Mas, estão ainda orgulhosos do seu novo estatuto: o ser médico! Aproveitem meus caros, dentro em breve serão o Médico-dedo-polegar. 
O Médico-dedo-polegar é o interno de especialidade. Carrega os processos pelos corredores, sabe soletrar cada diagnóstico de cada menino, senta-se no banco de trás, treme que nem varas verdes com as perguntas incómodas que não seriam para ele mas as quais tem mesmo que responder, assume as chicotadas das decisões ou que tomou porque estava sozinho, ou que alguém tomou mas não ouviu a pergunta, fecha os olhos no cadeirão duro de serviço, gosta de trabalhar à noite, não pode ficar doente ou melhor pode, mas depois ... ( e mais não digo). Não lhe conhecem o nome se forem muitos, não tem palmadinhas nas costas e os bons dias às vezes são mudos. 
O Médico-dedo-indicador, é um especialista com mais anos. Sabem muito de muitas coisas e falam pelos cotovelos.  Não gostam de se sentir velhos, mas quando chega à hora de dividir tarefas com os médicos-dedo-mindinho a antiguidade é um posto. Esquecem-se do caminho que fizeram e dos erros que cometeram, até porque acham que já ninguém se lembra. 
O Médico-dedo-anelar, é o médico da velha-guarda. O que não se sente atropelado pela inexperiente sapiência do Médico-dedo-mindinho. O que sabe quanto vale o ser médico. São raros, mas conheço alguns...
Desculpem se a carapuça menos dourada assentar na perfeição... Desculpem comparar os da minha tão nobre classe a dedos das mãos... A mim,  não me ofende e é só uma mera opinião.

A opinião da colega que postei ontem levou-me a escrever isto. Adorei o texto brilhante de uma Medica-dedo-polegar e porque passei por la há pouco, consigo viver cada palavra que escreveu. 




5 comentários:

  1. É esta frontalidade que falta quando tudo corre bem e/ou as aparências são suficientes para manter estatutos.
    A comparação com os dedos das mãos não podia ter mais sentido!
    Pois como eles, todos diferentes anatómica e funcionalmente, todos nós nas nossas classes profissionais temos diferentes comportamentos. Talvez só "falhe" um pouco o facto de os dedos da mão trabalharem sempre para o bem comum!!

    Parabéns pela, reconhecida, acutilância sobria cada vez mais necessária neste mundo de numeros.. de estatisticas... de objectivos....
    Principalmente na Saúde estamos a precisar de qualidade e não de quantidade.
    Principalmente se vierem assim com um sorriso tão orgulhoso da profissão e da classe.

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  2. Concordo plenamente contigo Sofia! Se me permites, acrescentaria num tipo de polidactilia, o médico do dedo extra, aquele que independentemente da conhecimento se esqueceu do que tanto lhe custou a passar e faz do interno que existe no seu serviço seu pagem, pois "no meu tempo...." eram super-heróis e sozinhos dominavam um hospital! Esse tempo já terminou!!! Além de que nesses tempos idos, horas extra eram bem pagas, o serviço de internato era com garantia o serviço em que ficaríamos como especialistas e no final de contas existiam carreiras médicas!!!

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  3. Não sei bem em que dedo me encaixo neste momento - sou um pseudo-anel-de-dedo-polegar que agora tem de assentar noutro dedo - e como no mindinho já não se consegue encaixar (porque os contratos individuais de trabalho foram-se) há que aguardar pelos fabulosos concursos para as ARS, para um dia poder ambicionar ser um médico dedo-indicador. Se entretanto a mão não for amputada, que é como quem diz o SNS liquidado.
    Adorei o teu texto.
    Bjinhos!

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  4. Concordo plenamente contigo Sofia, acho q vamos ser sempre dedos mindinhos. Bj. Bernarda

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  5. Parabéns Sofia, pela clareza e sensibilidade das suas palavras. E, já agora, seja qual fôr o seu dedo, ele será sempre extremamente importante para indicar caminhos a quem foi, como nós, de dedo em dedo, ao longo desta vida.
    De Mãe e Médica.
    Obrigada

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