A crónica do dia-a-dia do príncipe sem medo no reino encantado das paredes transparentes e de senhoras-fadas contado na primeira pessoa, tal como eu o imagino...
"Nos três dias seguintes e nos restantes que se
seguiram, por entre príncipes e
princesas quase iguais a mim, foi
assim. Por entre quatro paredes
transparentes com quatro janelas que
abriam e fechavam delicadamente, conseguia ver movimento lá fora... Passavam de
um lado para o outro umas senhoras-fadas, de mãos quentes com dedos de algodão,
que conseguiam ouvir o meu grito de entusiasmo e abriam as janelas para me
tocarem. Só não percebiam que não queria aquela feroz agulha no pé a cada duas horas, nem aquele senhor branco e doce como mel na minha boca, porque não sabia
o que fazer com ele. E, assim estive dias e dias a fio, a tentar ficar mais
doce, por entre fios que entravam e saiam de mim.
Mas as mãos mais quentes eram aquelas que voltavam todas as
manhãs, que me punham no colo e que cantavam ao meu ouvido baixinho. As que me
traziam trajes de príncipe com cheiro a nuvem e que me tocavam incessantemente
repletas de vontade de chorar. As que paravam suadas depois da picada no pé à
espera de ouvir um valor aceitável ou pelo menos mais aceitável. As que me
seguravam na cabeça e durante minutos sem fim insistiam em fazer-me beber
aquilo branco com sabor a mel.
Também percebi que os outros príncipes e princesas, cada um
no seu reino, afinal não eram quase iguais a mim... Tinham outras Mamãs, tinham outros fios e alguns tinham até umas máquinas amiguinhas (digo eu) que
as senhoras-fadas com os dedos de algodão carregavam.
No reino transparente mesmo à frente do meu, havia uma
princesa de cabelos cor do sol e olhos arregalados, a quem tinham feito um
desenho no sítio que faz tum-tum, que gritava alto e talvez por isso, vinham
muitas máquinas iluminadas e senhores de ar sério para a espreitar. (Nunca mais
a vi!)
E iam e vinham, e iam e vinham...novos príncipes e novas
princesas... Mas eu continuava cá."
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