O meu avô.
Apetece-me falar-vos do meu avô, de um senhor que conheci há muitos anos e que nos últimos tempos, se esquece de pedaços da sua história.
Fausto de nome. Primeiro Sargento de profissão. Mais de oito décadas de vida, bem vividas, como ele próprio dizia. Conhecido cá por casa por ser muito vagaroso nos almoços e prezar cumprir horas rígidas das refeições. Inseparável do seu garfo escurecido única companhia da cela escurecida da Índia onde estivera detido como preso político tal como tantos Portugueses. Passo quase marchado, lento e vagaroso, a orientar o seu pouco mais de 1,55 m de altura. Moreno com nariz proeminente onde sempre lhe conheci uns óculos. Outrora, barrigudo. Recheado de histórias de jacarés indianos e viagens de barco rumo a Goa. Recheado de uma vivacidade e autonomia que nos faziam esquecer os seus oitenta e muitos anos de vida.
Mas, os anos correm e as enfermidades chegam, silenciosas. E, quase que de um dia para o outro, perdes duas dezenas de quilos e deixas de saber em que dia estamos. Não te apetece sair, porque uns miúdos esqueceram o respeito que impunhas e roubaram-te a carteira, após te chamarem pelo nome e perguntarem as horas. (Cretinos...) Esqueceste o mapa de Portugal que sabias de cor e salteado. Esqueceste como gostavas de combinar as cores das calças e da camisola.
Confesso que quando contaste a história da saída nocturna, ri-me porque pensei que estavas a brincar (brincavas com a cara mais séria do mundo), mas o Mundo caiu-me aos pés quando percebi que na tua cabeça, tinhas de facto dormido apenas duas horas, porque a noite tinha sido de festa. Percebi que o homem que se levantava às 6 horas da manhã para regar o quintal alinhado de régua e esquadro e ir à padaria buscar-me pão ainda quente, já não era igual...
Perdi-te no caminho, por entre a vida apressada e a tua lentamente agitada a tua maneira.
Adorei o seu texto...
ResponderExcluirJá agora aproveito para vos desejar muitas felicidades para o novo rebento!
Ana Valente