Sofia Ribeiro Fernandes, crónicas de uma Mãe Pediatra e de uma Pediatra Mãe



Sofia Ribeiro Fernandes, crónicas de uma Mãe Pediatra e de uma Pediatra Mãe


quarta-feira, 12 de setembro de 2018

Conselho de Mãe, se me permitem

Aos pais que tão bem conheço. Aos pais de hoje. Aos pais que vão ao hospital sem dar paracetamol quando o termómetro chega aos 38. Aos pais que desejam filhos penteados e de roupas imaculadas. Aos pais que vão as consultas pré-peri-pos-natais, infantis, pubertárias e daí em diante. Aos pais que desejam que aos 4 anos os filhos falem francês e toquem  piano. Aos pais que não falham uma única sopa nas férias, nem que para isso tenham que suar as estopinhas. Aos pais que não dão açúcar, nem sal... até aos 3 anos. Aos pais que têm listas de perguntas, intermináveis e sensatas, escritas com data e hora em compêndios comprados para o efeito (e que caibam na carteira). Aos pais que leêm todas as enciclopédias de parentalidade e fazem cursos de como serem pais. Aos pais que delegam nos filhos a conquista de obras por eles não conseguidas.
Há um peso crescente da parentalidade perfeita, mas isso não existe. Costumo dizer, quando os pais se desculpam por os miúdos estarem sujos e que não tiveram tempo de sair da escola e ir à casa tomar banho antes da consulta:”se vissem os meus filhos, parece que brincam na terra...” e a conversa fica por aí. Faz parte...
Aos pais de hoje que são os nascidos nas décadas de 70/80, deixo para lerem o texto seguinte, escrito pela Mãe Imperfeita (do Blogue A Mãe Imperfeita), mas que está perfeito...
E, a propósito, permitam-se à felicidade de uma colher inteira de gelado, de uma camisola suja e, se necessário, de uns joelhos esmurrados. 

“Nascemos na década de 80. Somos a geração que comeu Cerelac, Nestum com mel e papas de farinha Maizena. Somos a geração que levava cem escudos para a escola primária e comprava um Bollycao no intervalo da manhã. Metíamos manteiga nas bolachas Maria e Nesquick no leite. As nossas festas de anos tinham sandes de fiambre e queijo mas também tinham salame e tortas Dancake. A nossa geração bebia Coca-Cola quando tinha diarreia mas antes as nossas mães "tiravam-lhe o gás". Comíamos batatas fritas da Matutano e fazíamos colecção de pega-monstros e tazos. Apesar disto somos também uma geração que aprendeu a comer sopa a todas as refeições e peixe cozido quando as nossas mães assim o entendiam. Não havia comida especial para nós e quando perguntávamos o que era o almoço recebíamos como resposta um "casquinhas de tremoço". Comíamos fruta como sobremesa porque nem nos passava pela cabeça não o fazer. Somos a geração que brincava na rua até à hora de jantar e, no Verão, ainda podíamos brincar depois dessa hora. Andávamos de bicicleta e íamos a pé para a escola, sozinhos ou com amigos. Até para mudar de canal na televisão tínhamos que nos levantar. Somos a geração que ligava para os discos pedidos, a geração que não dissocia a Ana Malhoa do Buereré, a geração que comprava cassetes dos Onda Choc nos expositores dos cafés. Fomos as princesas da Disney e os Power Rangers. Ainda somos do tempo em que os carros não tinham cinto de segurança nos bancos traseiros nem ar condicionado. Jogámos Tetris e tivémos Walkmans e Mega Drives. Tomámos comprimidos de flúor e bebemos óleo de fígado de bacalhau. 

A nossa geração comeu açúcar que se fartou, viu desenhos animados cheios de lutas e outros em que as meninas eram princesas à espera do príncipe encantado. E nenhum mal veio daí. Porque a nossa geração fez tudo com conta, peso e medida. A nossa geração teve mães que faziam o que podiam da melhor forma que sabiam, que seguiam o coração e não viam um papão em cada esquina. As nossas mães eram as mães que nos deixavam lamber a massa crua dos bolos mas que diziam que comer o bolo quente nos dava a volta à barriga. Podiam ser incoerentes, é certo, mas tinham filhos felizes. E nós tivémos mães imperfeitas mas que, na sua imperfeição, souberam dosear tudo e encontraram o equilíbrio. Saibamos nós ser hoje tão imperfeitas como elas foram um dia. Os nossos filhos ficarão gratos. Tal como nós somos gratos.

Que maravilhosas foram as mães dos filhos de 80.”




7 comentários:

  1. 100% de acordo. Tenho dois rapazes, acho que por serem rapazes são mais físicos e andam sempre às lutas, a correr, a serem felizes. Às vezes corre mal, caiem, aleijam-se e esfolam várias partes do corpo. Digo-lhe a eles e todos os adultos que fazem reparos (aí coitadinho aleijou-se) que são tatuagens da alegria!

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  2. Olá olá!!!!
    Concordo tanto com o que aqui dizes!!! Felizmente não me identifico nesses pais de 70/80. Nem um pouco...
    Beijinhos

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  3. Outra coisa... o texto que partilhaste do blogue "A Mãe Imperfeita" é divinal!!!

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    1. Sim, partilho-o porque está genialmente bem escrito pela Mãe Imperfeita como referi...
      e, foi o mote para a crónica

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